sexta-feira

Poematomas - O desdém


Os últimos instantes da mais longa luz do sol sobre teu rosto
e a tarde sorri e abre prolixos braços em eloquência e espanto.
A música inusitada do vento do assovio canário de poesia.
E no triscar do toque trememos vibrando glúteos guturais
inventando ismos fônicos ao gozo de penetrantes vogais.
Riste muito até o riso ficar de graça e perder encanto.
O que passa pelos poros fica mais que versos
não esgarça metáforas para dizer te amo.
Das dores mais agudas, a verdade dos lábios.



domingo

O pecado do poeta


tira a pedra mó do bolso
     afia
          atira no desgosto
que leio vejo ouço

desdinheira desreloja a vida


e antes das palavras ulcerarem
pega estrelas que pingam dos olhos
para escrever e dedicar o lugar comum mais bonito


  

sábado

Poematomas - Espinhos



beijar-te entre mordidas
e lacerar o tempo
o mundo

deste lábios ao esquecimento
neste verbo de mentiras

- você nunca esteve aqui

arda-me delírio em tua marca
                               tua falta

que nunca acabe
a sangria comprimida
e que a dor não pague
pelo pecado da palavra
não dita
espinhada nestes versos 



Ares do passado


Eliseu Mól, no livro "Chão Interior", de 1992

ares assim me deixam velho
rugas erodidas 
     de terra 
          na cara
morros calvos, muito calvos, quase nus

imagens do campo que me cobram
- onde está você agora?

estou tão vestido
e você tão nua
     minha terra
a mais pura nudez de quem nasce ou morre
     de quem mais morre que nasce

imagens do campo que me dão saudade
- onde está você agora?

estou tão sozinho
e você também tão sozinha
     minha terra
e não conseguimos mais medir a distância que nos separa

ares assim me deixam mais velho
março/92

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