sexta-feira

Tijolo

a margem ocupa o centro
trafica vida mutila sorriso sepulta sonho

a mão da tragédia é delicada
sabe apalpar donzelas
promete e entrega delírio
puberdades entre a morte e a cadeia

naquele dia
ar de se sentir estranha

o corpo que deu tanto a tantos fica sem dono sem ela
dívida na alma
grade no peito
chave que não mais se acha

pela entranha
agacha um tijolo de maconha

salva-se ao morrer de vergonha

.

sábado

Vinho, flor e tango


ir sempre ir sempre ir e andar só
a te querer a me levar numa lágrima
taça de vinho merlot a me lembrar tinto baton
sorver seu querer evoluir eternar
reflorescer então perfume em mim

deixa-me ir luzir e fruir fruta cor
vou te pernoitar estrela brotar cantiga de flor
num refletir de pele ao sol se por
dourar enluarar e leve enlouquecer de amor por ti

ah céu de doce ilusão
adstringente coração
não me quer
não me quer  
quer não

aroma denso
vaga mais livre que o vento
desendereçada
dama da noite

ai meus belos ares contigo jamais
este tango tonto solitário
só faz doer calo nos pés

triste milonga
por um anjo vagueio 
por onde não sei
eu não sei
sim por não querer saber

mas eu sei que amarei sempre
este peito nasceu só por ti

ir sempre ir sempre ir e andar só
ainda há tanto de mar a sangrar numa lágrima
bandoneón a desacorçoar
ao ver a taça se abrir em pétalas  
para adegar teu buquê em mim



sexta-feira

Dorfagia



RE-TALHOS, de Ma Ferreira
 
resta teu rosto de anjo em seda peçonha
que corta em retalhos olhares de porta-retratos

nem mais ao longe levas

ombros encolhidos me serviste
ausência de dobrar pescoço joelhos
pratos à luz de trevas
reza rastejante
triste consternação de pássaros
secando palavras

quero mais não 


hoje recorto tuas asas
e como teus cacos


.

terça-feira

Remanso

Escarpas
a rede conta e descarta o tempo
range voz suave ao coração
galanteio de balanço

põe fim à corredeira
- a foz, jamais
para quem
na cumeeira do ponteio
saboreia a vida no remanso

.