sábado

Perdão da liberdade

Paulo Vieira, Inédito Um 013
perdão do ódio que nega-se amor
da lágrima pelo choro frágil
                                   absurdo

perdão da vida
             por achar que era sua
do tempo
             a não se remir

o perdão da ausência
               que suplicam sol e lua

que mesmo podendo ser fácil não se faz pedir
o perdão dito surdo
                - disse que deu?

o perdão que não pude dar
               porque não era meu


O arremate do Giz de Alfaiate

Para Seu Tonim, na provocação de Roberto Lima
o som preciso da afiada tesoura
     desejo de cós sem presilhas
     pele sem vincos pregas
sem dedais para alinhavar na bainha dos olhos
o que a lua prateia e o sol doura

a palavra corte - mesmo que cerzidamente escrita - nunca cicatriza

ainda há de ser a unha comprida e dura
marcar no tecido do tempo
suave giz a desenhar por onde a vida fere
     a suja mão italiana rouba
     a luxúria vaticana agoura

não há liberdade na mascara no molde
                   e por mais que isso revolte
                                                        sim

                       hoje o sonho está preso

   

quarta-feira

Tão triste


olha-me
ainda dobro as asas que me levam a ti
e melancólico eu vou até que me rende
de tão triste tristonho morrer

qual sonhei
donde trazes violinos eu voei
mais que do céu relampeou
mil vezes cair 
e não me viste 
nos olhos 
mentir

te pertenci
desde que me encantou
com seu jazz nosso jazz com jeito de blues

donde não parecia a nenhum de nós
que tudo acabaria em vão

nem mais um
nem mais a nossa bossa nova ouvir ao longe
dois pra lá dois pra cá de bem mais perto
teu rosto de novo

me feriste
de morte
amor

te pertenci
desde que me entoou
com esta voz e ao redor tudo mudo

donde não parecia a nenhum de nós
que tudo acabaria em vão

nem mais um
nem mais a nossa bossa nova ouvir de longe
e tremer nas pernas um tango leve
um samba canção

me feriste 
de morte
amor

de 
tão triste
vou morrer
de 
amor

  



 

domingo

Poema na cama


semblante moleque
dorme e se desfaz e faz
  ausente acuado
  que o mundo sossegue

deita sob pálpebras
retalho de vida sobre a cama inerte

pousa peito liberto
meigo recatado
vinho recém aberto

aceita e esquece
que para a saudade todo amor sempre se perde

dorme criança linda
que mansa assim
          a mim entregue 
parece
          e por isso me faz 
mais feliz ainda