quinta-feira

Poema de ácido amor

Paulo Vieira (estudos) - Contorcionista 1 
neste álbum de momentos impunes
         guardo lágrimas
         regurgitos de pura vaidade
         no fel da farsa
                         que engasga e cala

mas não ensurdeço
- verso de amor não putrefaz palavra

ah
é bom sim acarinhar
os amantes que se assumem
e por assim escarniar
     são imunes
            aos pulhas
                   e seus azedumes

  

sexta-feira

Esquina do fim

Paulo Vieira - figuras sentadas 003

que se esvai 
           abandonando-se 
dedos frouxos na tramela
                           trêmula retina
janela sem marquise


(o que pode herdar esta noite dos dias de sobra que não se viram guardar?)


nas correntes do vento 
                         empurradas pela tempestade
desencadear-nos-emos em milagres miragens
recatadamente 

reinará
templo portal do tempo 

estranhado nos olhos 
 publicado na Tertúlia Pão de Queijo



terça-feira

Ah, seu doce olhar

namoro de longe
como monge
a meditar

desejo de amor atrevido
que jamais se esconde
não consigo evitar

beijo em noite quente chuvosa                  
sua carne de vento e barro
templo sem lugar

e fico todo atrapalhado
quando vem perto
seu jeito meigo de doce olhar

se ainda mais perto mais me perco
perto demais
- ai meu Deus

tão perto que se faz dentro
e me faço
guardar


domingo

O agitador

 a Murilo Teixeira

Praça Serra Lima, Governador Valadares - berço do Movimento Poético, há três décadas


poeta do belo 
          singelo
farpado entre amarras
arado da palavra 
              cravada
              irrenunciável

agitador de gente
tropas em trovas
artesão de longa e grisalha vida

amante do fardo do dia 
                  - a cada dia
do único amor 
                 - aos amores intransparecíveis

adubou-se da desconexa dualidade da vida
   de estar e não ser
   e não se contentar
      de ser e não se achar
      e só nos versos senti-la cantar

de trovar os sonhos
que não amanhecem


quinta-feira

A dois, adeus

na cabeça
     um reino alheio ao peito


duma noite de céu aberto
                      frio intenso
ficam mãos
         que perfumam a pele
- a cama macia


deixei-me contigo
na taça
     um vinho permanente
na dança
     braço quente
guardando-te forte


sonhei muito amar seu amor
        mas coração não sonha
        bate
           ou não
                 bate

foste de mim
livre como chegaste

e a gente vai sem jeito
- já que nada se faz desfeito
num adeus
       a dois